terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Oposição, consciência e ética.

(Publicado no site Panorama Tricolor em 28.12.2014)

O objetivo deste texto não é o de tratar da oposição tricolor em suas especificidades, em miudezas. Ao contrário, busca traçar um panorama genérico de como deveria funcionar uma oposição ou situação consciente de que nenhum interesse particular deve suplantar o interesse maior da instituição Fluminense Football Club.

Faltam, assim, dois anos para as eleições presidenciais do Fluminense e já se apresentam, oficialmente ou não, correntes contrárias à atual gestão tricolor que, reconduzida à presidência em novembro de 2013, mostra os sinais de um desgaste natural após dois mandatos consecutivos. Até mesmo Celso Barros, presidente da ex-patrocinadora do Flu, já manifestou expressamente seu interesse em participar, não se sabe ainda se apenas através de apoio a algum grupo político de oposição, ou mesmo como candidato à própria presidência, da disputa eleitoral. De toda a sorte, Celso Barros já é oposição, ou já era há algum tempo e somente agora, com o rompimento oficial da parceria, pôde deixar isso bem claro.

Não que a formação de grupos oposicionistas decorra necessariamente da existência de um pleito próximo, mas, naturalmente, eles se robustecem à medida em que o caminho até o próximo se avizinha tormentoso para a atual administração.

Certamente, o Presidente Peter Siemsen, impossibilitado de se reeleger uma terceira vez, apoiará um candidato que encampe seus ideais e siga a sua linha política, o que desde já provoca a repulsa de tricolores decepcionados com a sua gestão. Quando digo decepcionados, entendo que este seria o termo adequado para quem quase que unanimemente o reelegeu há pouco mais de um ano. Foi um massacre nas urnas contra o candidato da oposição, Deley; uma vitória contundente e respaldada menos por seu desempenho como gestor de futebol do que por sua capacidade administrativa – afinal de contas 2013 foi um ano catastrófico dentro dos gramados para o Fluminense – e favorecido, ainda, pela vetusta corrente política que apoiava o seu adversário. Nesse sentido, preferi o termo “decepcionados” a, por exemplo, “revoltados” ou “indignados”, porque grande parte dos que hoje contestam a sua gestão, muito provavelmente, em algum momento, já o apoiou e acreditou em seus projetos.

Pois bem. O ano de 2014 também não foi bom para o Tricolor e o de 2015 insinua-se ainda mais turbulento ante a drástica redução das verbas destinadas ao futebol pela recente perda do patrocínio-master da Unimed; e, é nesse cenário fértil às críticas e cobranças, que as correntes oposicionistas tendem a proliferar. Infelizmente, é uma realidade cruel e não afeita apenas à política interna dos clubes de futebol. Muito ao contrário, trata-se de reflexo da política que se vê no dia a dia, nos gabinetes executivos e legislativos, maquiavélica, porém real, nos assuntos internos de qualquer clube.

Nenhuma crítica aqui se faz à existência da oposição política. Assim como é necessária ao recrudescimento da democracia, porque dá ao cidadão a oportunidade de escolher, dentre as propostas existentes, aquela que melhor atende aos seus anseios para substituir o sistema vigente, também é fundamental, guardadas as proporções devidas, quando se trata das correntes de pensamento internas de um clube, aptas a renovarem o quadro político dominante.

A oposição consciente, tanto quanto necessária, é saudável. Barbosa Lima Sobrinho, brilhantemente, ensinou que  "Falta de oposição é fenômeno grave, porque nunca se sabe o que vai surgir. Se não há contestação cruzam-se os braços e aceita-se o fato consumado que, muitas vezes, no íntimo se repele." A contestação é, portanto, imprescindível para se modificar aquilo que não funciona, ou funciona precariamente no ambiente social e político em que vivemos.

Mas somente a oposição consciente e ética é saudável. A crítica, por mais ferrenha que possa parecer, deve vir acompanhada de sugestões, projetos e ser precipuamente ética. O ataque pessoal e o questionamento despropositado, gratuito e fulcrado somente na rivalidade política desconstrói a imagem de uma oposição coerente e capaz de revolver os alicerces que sustentam a corrente política da situação.

Nas próximas eleições presidenciais do Fluminense haverá, pela primeira vez, a participação efetiva do sócio-torcedor associado há pelo menos dois anos da data do pleito. Esse torcedor “comum” certamente decidirá o destino do clube em 2016 e é a ele que se deve tentar convencer, tanto oposição quanto situação, acerca do que é o melhor para o Fluminense.

Uma oposição sistemática, baseada apenas em ataques à gestão atual sem levar em consideração seus pontos positivos ou projetos alternativos, estará fadada ao fracasso. É preciso entender que, antes de ser oposição ou situação, o torcedor almeja o bem do Fluminense e, para tanto, deseja conhecer propostas, opções que possam tornar o clube cada vez mais forte. Nesse ponto, o torcedor também repudia a falta de ética, as ofensas gratuitas, porque com certa frequência, quem assim age procura apenas dissimular a sua incapacidade política para contrapor as ideias da gestão no poder. E isto é sinônimo de fraqueza.

O que importa realmente para o Fluminense é que as correntes oposicionistas, algumas já em franca campanha, e as que surgirem, tanto quanto a situação, promovam um debate no campo das ideias. Dessa forma, o torcedor poderá escolher de acordo com a sua própria consciência qual a melhor linha a seguir. A contundência das intervenções, assim, deve se ater às propostas e aos questionamentos coerentes, porque a oposição consciente valoriza o debate e constroi um ambiente propício ao engrandecimento do clube mostrando-se como opção viável ao projeto vigente.

E é disso que o torcedor precisa, de uma alternativa viável, caso seja de seu interesse mudar o que aí está posto.

Serão dois anos problemáticos pelas dificuldades financeiras que o clube fatalmente enfrentará. Tudo o que o Fluminense não precisa é de que esse biênio seja transformado, também, num período de conturbada atividade política que perturbe ainda mais o seu ambiente interno. Para tanto, oposição e situação devem se conscientizar de que mais do que seus próprios interesses é o interesse do Fluminense que deve preponderar e de que o embate saudável, adstrito às ideias, tornará a campanha eleitoral apta a fornecer aos eleitores opções verdadeiramente comprometidas com o futuro tricolor.

A antecipação do debate eleitoral é aceitável e até previsível diante do quadro que se apresenta; esse largo período tanto pode ser útil à construção de um projeto político eficaz e à conscientização do eleitor, como pode ser, por outro lado, um obstáculo à caminhada do Fluminense rumo aos seus objetivos. Nessa toada, importante distinguir o homem da instituição; nem sempre se atinge o primeiro sem que sofra consequências a segunda e, portanto, toda cautela é pouca no agir.


Sejamos políticos mas, sobretudo, sejamos tricolores.


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