terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

O rigor da lei


Escrevi no site Panorama Tricolor, na semana anterior ao jogo entre Fluminense e Vasco, um texto sobre impunidade e violência no futebol, onde sugeri que um dos caminhos para se combater a violência que grassa entre as torcidas organizadas passa, primeiramente, por se afastar a impunidade através do “prender” e do “punir” o transgressor, aplicando-lhe a Lei com rigor.


Para se impedir medidas inócuas, como penas alternativas de proibição de frequentar estádios, dentre outras, seria preciso imputar ao integrante da organizada crimes “mais graves” que permitissem a sua prisão em flagrante, adequando-se o fato ao crime previsto na Lei. Foi exatamente isso o que fez a delegada titular da 24ª DP, quando autuou 119 membros de organizadas de Flu e Vasco, sendo 19 menores, pelos crimes de associação criminosa qualificada (pena de 1 ano e 6 meses e 4 anos e 6 meses de reclusão – art. 288 do CP) e promoção de tumulto no entorno do estádio (pena de 1 a 2 anos de reclusão e multa – art. 41 B, inciso I, da Lei 10671/2003, o Estatuto do Torcedor), títulos criminais que permitem a prisão flagrancial e a remessa do processo ao Ministério Público para dar início à ação penal, impedindo que os indiciados sejam postos imediatamente em liberdade após receberem levíssimas penas alternativas, como sói acontecer no âmbito dos Juizados Especiais.



Foi a maior prisão conjunta de que se tem notícia no âmbito dos confrontos entre torcidas organizadas. Em outras oportunidades, como por exemplo, em 2011, quando 102 torcedores de Vasco e Flamengo foram detidos em Niterói após confrontarem-se, ou quando 87 membros de torcidas de Flamengo e Atlético também se enfrentaram em 2014 e ainda recentemente, oportunidade em que mais de 40 integrantes da maior facção de torcida do Corinthians depredou vagão de metrô e agrediram quatro torcedores do São Paulo, todos foram conduzidos aos Juizados, prestaram depoimentos e foram liberados com penas brandas, se tanto.



O que se espera é que o exemplo seja seguido pelos órgãos de persecução em todo o território nacional para que integrantes de organizadas, daqui por diante, pensem duas vezes antes de agendar confrontos e praticar crimes, sabedores de que, se presos, receberão pesada reprimenda penal.



E que o rigor da lei recaia somente sobre os responsáveis pelos atos de violência, depois de um processo justo e com amplo direito de defesa, porque enquanto não transitada em julgado eventual sentença condenatória, todos devem ser considerados presumidamente inocentes.

@FFleury

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Simpatizantes & torcedores

Há alguns dias me deparei com uma polêmica postagem numa rede social. Alguém escreveu que o Fluminense, por ser um clube originário do Rio de Janeiro, somente teria torcedores aqui – cidade e estado; os demais fãs, espalhados por todos os cantos do país, não seriam torcedores, mas apenas simpatizantes.

Trata-se, evidentemente, de uma visão distorcida e até mesmo discriminatória, mas que nos leva a uma reflexão mais profunda sobre o que sejam, realmente, simpatizantes e torcedores no mundo do futebol, mais especificamente no que diz respeito ao Fluminense Football Club.

Desconsiderar essa parcela extra-Rio de Janeiro da torcida tricolor é ser, no mínimo, injusto com torcedores que aprenderam a amar o Fluminense apenas imaginando, ao ouvir as transmissões radiofônicas de outrora, os grandiosos times que nossos antepassados cariocas tiveram a oportunidade de assistir  ao vivo. Muitos daqueles, que só tinham o rádio como fonte de informações, morreram sem ter visto o clube que aprenderam a amar uma única vez; porém, mesmo assim, transmitiram a sua paixão para filhos e netos nos mais diversos rincões do Brasil. Como não reconhecer a eles, então, o status de verdadeiros torcedores?

São esses tricolores do Distrito Federal, de Santa Catarina, do Espírito Santo, de Mato Grosso, de Rondônia, do Amazonas, por exemplo, que dão ao Fluminense a natureza de um clube nacional. E muitos desses, não se olvide, participam mais ativamente da vida tricolor do que muitos cariocas que residem próximos às Laranjeiras ou aos estádios onde o Flu costuma se apresentar.

Essa distinção não pode se dar, portanto, apenas pelo critério geográfico.

O que distinguiria, assim, simpatizantes de torcedores? A resposta a essa indagação é importante não somente para que se tenha uma noção mais exata do tamanho da torcida, mas para que esta seja explorada como fonte de receitas para o clube através de um marketing eficiente.

O torcedor, segundo penso, é quem acompanha, se interessa pelos assuntos e produtos do Fluminense, aqui no Rio, em Manaus ou em Worcester. A sua pouca ou nenhuma frequência aos jogos, assim como o local em que nasceu, não podem ser fatores determinantes para o seu “rebaixamento” ao patamar de simpatizante. Por vezes a distância, as condições financeiras e outras circunstâncias o impedem de acompanhar presencialmente seu time, mas não o impedem de tê-lo permanentemente em seu coração.

O simpatizante é, mas não é. Para ele tanto faz uma derrota ou vitória, porque nenhum sentimento nutre pelo clube, senão o da mera simpatia. Pelas cores, pelas origens, pela gratidão a algum parente, seja pelo que for, o simpatizante não torce, apenas simpatiza.

Se um instituto de pesquisas fizesse uma enquete sobre o time para o qual torce o entrevistado, o torcedor responderia taxativamente: “Fluminense”; o simpatizante, por sua vez, diria: “Não sou muito fã de futebol, mas pode por aí Fluminense”. O traço distintivo necessariamente envolve o sentimento.

Eu mesmo conheço torcedores que, com o passar do tempo, se transformaram em simpatizantes e simpatizantes que se tornaram torcedores, o que significa que é sempre importante ao marketing estar atento a essas correntes migratórias que vez por outra mudam a cara de parte da torcida, esta entendida em sentido amplo – aqui se incluem os simpatizantes -, porque o principal destinatário dos produtos do clube é o torcedor, não o simpatizante. E é pelo número de torcedores, em sentido estrito, que se mede o potencial econômico da torcida.

É o torcedor, em sentido estrito – aqui se exclui o simpatizante -, quem, cumulativamente ou não, exterioriza a sua paixão através da aquisição de produtos oficiais do clube, da associação, da compra ingressos e pacotes de pay-per-view, mas é sobretudo quem ama o Fluminense independentemente do que a sua capacidade financeira seja capaz de comprar. O sentimento de amor ao clube parece ser, assim, um eficiente diferencial entre quem torce e simpatiza. É ele quem move o torcedor aos estádios longínquos, manipula o seu humor nas vitórias e nas derrotas e lhe dá o direito de transmitir aos filhos a sua paixão.

Simpatizantes e torcedores constituem uma torcida em sentido amplo, mas somente estes últimos estarão ao lado do clube, porque o amam, nos bons e nos maus momentos.

De toda a sorte, caso não tenha parecido clara ao leitor a distinção que propus fazer entre simpatizante e torcedor, talvez esta seja bastante simples e definitiva: se alguém, por acaso, disser que você é um simpatizante e isso lhe soar como uma ofensa, certamente você é um torcedor.



domingo, 22 de fevereiro de 2015

Já deu

Mais uma derrota, mais uma péssima atuação, mais constrangimento para o torcedor tricolor. E por tudo o que foi dito antes do clássico, a única coisa que não merecíamos, nós torcedores, era sucumbir a um time medíocre, mas esforçado, como o do Vasco. Enquanto Eurico saboreia seu charuto, o torcedor tricolor amarga mais um fracasso perante o time da colina.

O primeiro tempo foi muito ruim. Feio de doer. Tanto que o Flu deu dois chutes em direção ao gol e apenas um com relativo perigo, após os 30 minutos de jogo. O Vasco sempre tomou a iniciativa e o Tricolor postou-se, inexplicavelmente, atrás, esperando os contra-ataques que não existiram. O adversário teve mais posse de bola, foi mais incisivo e organizado, mas as equipes se equivaleram em fragilidade técnica dentro de campo. Fred quase não viu a cor da bola, Marlone mal, Lucas Gomes inefetivo, Jean sumido e Vinícius, também perdido, indicaram o quão inoperante foi o setor ofensivo do Fluminense.

Some-se a isso um árbitro permissivo, que deixou a violência brotar em cada lance e foi um dos responsáveis pelo baixo nível técnico da partida.

Para o segundo tempo, Cristóvão trocou Marlone, que esteve muito mal na primeira etapa, por Kennedy. Logo depois, sacou Lucas Gomes e colocou Gerson, mas nem o garoto deu ânimo novo ao Tricolor, que continuou apático dentro de campo. Se o Vasco foi melhor no primeiro tempo, sobrou no segundo, pressionando o Flu que, atordoado, não sabia o que fazer no gramado. Duas bolas na trave e a iniciativa total davam a noção da superioridade vascaína, enquanto o Fluminense insistia na ressuscitada e ineficientíssima estratégia de Cristóvão de lançar as bolas de qualquer jeito e qualquer distância para Fred. Todas as jogadas, evidentemente, interrompidas pela boa zaga adversária. A nossa, por outro lado, deixava passar todas as bolas, sem exceção!

O resultado fez justiça ao que foi a partida, em que pese a péssima arbitragem do senhor Luiz Antônio Silva Santos, conhecido pela alcunha de “Índio”. Na segunda etapa compensou visivelmente um pênalti que alguém deve ter alertado que existiu sobre um jogador vascaíno. Parou o jogo, não deixou o Flu dar sequência às jogadas, deixou de expulsar o carniceiro Guinazu, marcou um pênalti duvidoso a favor do Vasco e ainda teve fôlego para expulsar Rafinha sem, nem mesmo, ter-lhe aplicado anteriormente o cartão amarelo, numa falta que valeria apenas a advertência deste último cartão.


Mas nem a pífia arbitragem apagou o pífio desempenho do Flu. 

O Vasco, certamente, encontrou mais dificuldades contra o Barra Mansa, durante a semana, do que contra o Tricolor. E o Fluminense nunca pode jogar como o Barra Mansa e nem pode ter um treinador de um time como o Barra Mansa. Chega da mesmice de Cristóvão. Esse filme todos já conhecemos. Já deu.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

As cinzas tricolores

Na quarta-feira chuvosa de Volta Redonda, as cinzas foram todas tricolores.

Mal no primeiro tempo, quando o time centralizou o jogo e abdicou da sua principal arma, a jogada pelas laterais, o Fluminense foi menos do que uma sombra do que vinha sendo no campeonato até então. Marlone e Robert eram os piores em campo, e o tricolor só foi um pouco mais perigoso quando utilizou, principalmente, a lateral direita, com Wellington Silva e Lucas Gomes. Dois chutes deste último e uma cabeçada perigosa de Fred e mais nada.

Cristóvão detectou os problemas tricolores e sacou Robert logo no intervalo. Demorou mais quinze minutos para tirar Marlone. O Flu era melhor em campo quando Wellington Silva, tão eficiente na frente, foi suplantado na marcação pelo rápido jogador adversário, que, sem uma cobertura eficiente, chegou livre para marcar o gol da equipe do Volta Redonda.

O Tricolor novamente foi para cima e Vinícius, que substituíra Robert, deu excelente passe para Wellington Silva – herói e vilão – deixar Jean livre para marcar o gol de empate do Fluminense. Com o ânimo renovado, o Flu passou a pressionar em busca do gol da vitória, quando Jean – também herói e vilão – deu um passe açucarado para o adversário encontrar seu companheiro livre e a nossa defesa desguarnecida e marcar o tento da vitória.

O Fluminense ainda foi à frente, mesmo correndo o risco de sofrer o terceiro gol – o que quase ocorreu – e por pouco não empatou a partida, o que, nas circunstâncias – Edson saiu contundido e deixou o time com menos um em campo – não seria tão ruim.

Fred chegou com perigo três vezes de cabeça. Por pouco não fez o seu gol. Mas não era noite para o Tricolor. Foi uma noite de heróis e vilões, Jean e Wellington Silva, e de um vilão, o árbitro, que segurou o time do Flu com faltas inventadas, outras invertidas e deixou de assinalar um pênalti claríssimo no segundo tempo. Convertido, muito provavelmente estaríamos agora comemorando outra vitória.

Que sirva de alerta a derrota para que todos saibam que temos um time em formação, que precisa de tempo e jogos para se firmar e que, se não temos uma equipe muito pior do que as outras, também não temos uma muito melhor. A diferença deste Fluminense de 2015 para os dois últimos que vimos no biênio 2013/2014, será a dedicação dentro de campo, o espírito coletivo e muita fé para que soframos poucas baixas durante a temporada.


Que venha o Vasco!

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Impunidade e violência das torcidas organizadas

Ressalto, antes de prosseguir, que não sou contra as torcidas organizadas. Sou contra os bandidos que nelas se infiltram para agredir, matar e roubar sob o pálio do anonimato.

Episódios reiterados de violência entre bandidos infiltrados em torcidas organizadas têm inundado as páginas dos informativos esportivos e policiais neste início de temporada. Não que o fato seja novidade, mas da forma como começou o ano, é bem provável que a avalanche de terror e violência seja a maior dos últimos tempos.

Os grandes clássicos regionais e nacionais sempre foram excelentes chamarizes para confrontos entre marginais travestidos de torcedores; atualmente, porém, a brutalidade se aprimorou. Com as facilidades proporcionadas pelas redes sociais, a ansiedade pelos clássicos terminou. A sanha sanguinária desses vândalos pode ser satisfeita a qualquer hora, em qualquer esquina, nos trens ou metrôs, de segunda a sexta-feira, independentemente de jogo marcado.  

Via de regra, a explosão de ódio e intolerância é direcionada ao torcedor do clube rival, o inimigo em potencial. Mas nem sempre a vítima está do lado oposto da arquibancada. Já não é de hoje que torcedores do mesmo clube também se engalfinham. Em alguns casos, como já ocorreu com membros de organizadas de Flamengo e Vasco, por exemplo, tiveram de ser separados por cordões de policiais dentro do estádio. Torcedores organizados do Corínthians brigaram recentemente para garantir quem colocaria a sua faixa no pequeno espaço reservado na Arena do Palmeiras; os torcedores palmeirenses, por sua vez, se agrediram fora do estádio; fato idêntico ocorreu com torcedores do Bahia ano passado. Membros de uma torcida do Flamengo invadiram o vestiário do Macaé. Pilharam, lesionaram o goleiro da equipe adversária e voltaram impunemente para as arquibancadas.

A pancadaria atual é contra tudo e contra todos, não escolhe alvo e nem divisão. Não raro, torcedores de clubes menores também se digladiam contra seus rivais locais.

E mesmo os torcedores comuns, aqueles que nunca sonharam integrar uma facção de torcida, comumente têm sido atacados covardemente apenas por vestirem a camisa de seus clubes. Famílias são alijadas dos estádios de futebol, porque ir a qualquer um deles ultimamente tem sido uma atividade de risco. Sabe-se que vai, mas não se sabe se chega ou se volta.

Algumas torcidas organizadas funcionam como verdadeiras organizações criminosas, em cujas sedes se homiziam criminosos com vasta folha penal, guardam-se armas de fogo, drogas e outros instrumentos para prática de violência. Trata-se de um problema social grave que transcendeu as rixas futebolísticas e, não raro, envolve disputas entre facções criminosas relacionadas ao tráfico de drogas. E não se deve olvidar que dirigentes inescrupulosos financiam esses grupos, dando-lhes poder e dinheiro, a fim de manipulá-los politicamente. Muitos têm livre acesso aos clubes e gratuidade garantida nos estádios por uma enxurrada de ingressos doados pelos cartolas.

A solução é complexa e não pode ser dada em parcas linhas. Nem é minha pretensão fazê-lo. No entanto, parece claro que deva passar necessariamente por ações preventivas desenvolvidas pela inteligência policial para evitar confrontos previamente agendados – infiltrando agentes, interceptando mensagens, investigando redes sociais - e por uma ação repressiva, manejada pelo Judiciário através da decretação ou manutenção da prisão e da responsabilização penal dos agressores, afastando-se, assim, a impunidade. Soam casuísticas e oportunistas as propostas levantadas por autoridades que, a cada morte, a cada violência perpetrada por membros de organizadas, sob a luz dos holofotes, vêm a público dizer que é preciso criar leis, aumentar penas etc. As leis existem, as penas também. Falta efetivamente prender e punir.

Lembro-me de que há algum tempo integrantes de uma organizada tricolor foram presos após agredir e roubar torcedores vascaínos. Acompanhei o caso e constatei o rigor da Chefe de Polícia, do Ministério Púbico e do Judiciário. A maioria foi processada por formação de quadrilha e  alguns também por roubo, estes últimos condenados a penas elevadas. É assim que se deve agir. Contra todos. Permaneci atento ao noticiário e não tive mais notícias, apesar dos reiterados episódios de conflitos entre torcidas, de outra atuação conjunta Executivo-Judiciário tão eficaz.

Torcedores de Atlético-PR e Vasco que protagonizaram lamentáveis cenas de violência em Joinville, na última rodada do Brasileiro de 2013, estão soltos. Membros da Gaviões da Fiel que depredaram um vagão de metrô – patrimônio considerado público – e espancaram quatro torcedores do São Paulo há poucos dias pagaram fiança e estão na rua. Outros tantos autores de crimes envolvendo torcidas de clubes de futebol também continuam impunes. Isso não é problema de falta de Lei é problema da sua má aplicação. Grupos de torcidas organizadas presos cometendo atos de vandalismo ou agressões são organizações criminosas e, como tal, devem ser tratados. Some-se à pena pelo crime de associação criminosa a de roubo ou outro ilícito praticado, e os seus autores provavelmente receberão uma bela reprimenda penal.

Tratá-los de forma diferenciada, sujeitando-os às regras processuais de Juizados Criminais – que julgam crimes de menor potencial ofensivo, diferentemente das Varas Criminais, que processam e julgam crimes mais graves – somente fomentará nos autores o sentimento da impunidade, uma vez que sofrerão penas levíssimas, que vão desde o pagamento de cestas básicas até a proibição de frequentar partidas de seu clube, como se essa proibição fosse suficiente para impedir que provoquem o caos antes ou depois dos jogos, ou até mesmo quando não há jogo.

Nem a proibição da torcida, ou mesmo seu banimento, são medidas suficientes para impedir atos criminosos de seus integrantes. Afinal de contas, o vândalo age independentemente de estar uniformizado, e a torcida, como já se viu, muda de nome e volta faceira às arquibancadas.

A certeza da impunidade talvez não seja a causa desse grave problema, mas por certo é um dos motivos pelos quais a violência é reiteradamente praticada. Se o agressor sabe que não será punido, ou terá sua reprimenda abrandada ou substituída por “cestas básicas”, ele se sentirá motivado a tornar a delinquir. O eminente jurista Nelson Hungria ensinava que: “ao analisarmos as causas de todos os crimes, veremos que elas estão não na quantidade das penas, mas na impunidade deles.”. Para ele não se combatia a criminalidade aumentando as penas, mas punindo o fato criminoso de acordo com o ordenamento vigente. A impunidade provoca no âmago do criminoso o sentimento de que a sua conduta é de somenos importância para o Estado, e, portanto, que poderá reiterá-la porque nenhuma sanção eficaz sofrerá. Um dos delitos mais graves do Código Penal, por exemplo, é o latrocínio – matar para roubar -, mas nem por isso é menos praticado. O bandido não tem medo da pena abstrata prevista no código – aquela gravada no texto frio da Lei -, tem medo é de ser preso e ter que efetivamente cumpri-la.

Assim, o “prender” e o “punir” ainda são os meios mais efetivos na luta contra a impunidade.

Infelizmente, entretanto, nem sempre é assim que funciona. Pode parecer contraditório, mas direitos e garantias fundamentais, recursos processuais e benefícios legais, que existem para proteger o réu inocente de um processo injusto – “mais vale um criminoso absolvido do que um inocente condenado” – são fórmulas eficazes, nas mãos de bons advogados, para impedir a responsabilização penal dos transgressores da lei e da ordem.

E de antemão alerto que limitar benefícios e garantias fundamentais encontra óbice na própria Constituição Federal. Até mesmo o crime considerado hediondo, cuja gravidade justifica um certo limite à concessão de benefícios, já teve o seu rigor relativizado para admitir liberdade provisória, progressão mais benéfica de regime prisional e até mesmo substituição da pena de prisão por prestação de serviço comunitário, como no caso do tráfico de drogas.

Parece que estamos num beco sem saída, onde o melhor caminho ainda é a aplicação irrestrita da lei, mesmo sendo esta suscetível de variada interpretação e subterfúgios processuais que, por vezes, darão ao criminoso a oportunidade de escapar à responsabilização penal. Não se pode, contudo, dela abdicar, pois aí sim o autor do fato criminoso receberá verdadeiro salvo-conduto para continuar a perpetrar delitos.

Enquanto as autoridades discutem o que fazer, a violência explode em níveis alarmantes, vitimizando torcedores de bem. O torcedor é compulsoriamente alijado do seu maior prazer para a garantia de sua integridade física e até mesmo de sua vida e a de sua família. Já temos estádios com torcida única. Em breve, os jogos serão disputados sem torcida alguma.

Péssimo para todos nós que vivenciaram um dia a magnitude de um estádio lotado em dias de clássico, sem cordões de isolamento ou policiais que separassem as torcidas. Uma época em que a “violência” era a galhofa ao rival e vencedores e perdedores sempre saíam ganhando com as boas recordações do espetáculo.


Se nada for feito para impedir a ação desses baderneiros, o futebol estará condenado a um triste fim, transformando-se em mera atração televisiva, se tanto, sem o calor e a paixão do torcedor de bem, aquele que, verdadeiramente, faz do jogo um espetáculo.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Quanto vale Fred?

(Publicado no site Panorama Tricolor em 08.02.2015.)


Quando Fred renovou o seu contrato com o Fluminense - segundo consta por um valor inicial inferior ao que recebia, oitocentos mil mensais, com reajustes anuais progressivos até o patamar de novecentos e cinquenta mil reais em 2019, último ano de seu contrato - algumas vozes se levantaram para denunciar o que seria um péssimo negócio para o Flu e um ótimo para o jogador. Já em fim de carreira, segundo os críticos mais mordazes, e sem condições físicas de ser o atleta de outros tempos (neste ponto esquecem a sua recente artilharia na última versão do campeonato brasileiro e a que já se esboça neste estadual), esse novo contrato seria uma espécie de nababesca aposentadoria. Dinheiro fácil até o fim de sua carreira como jogador de futebol.

Não tenho uma bola de cristal para prever o quanto Fred renderá dentro de campo, se fará ou não jus a esse vultoso salário com a bola nos pés, ou mesmo se o Fluminense terá saúde financeira para pagá-lo.

Mais do que a discussão de valores, porém, o sim de Fred à proposta tricolor representou não somente o seu desejo de continuar no clube, mas, sobretudo, o seu aval, uma espécie de "eu acredito", a um novo projeto que outros atletas rejeitaram. Acreditar nessa nova realidade financeira, sem o lastro do derrame de dinheiro proporcionado pela finada Unimed, e colaborar, com seu status de líder e ídolo, para que os novos e, certamente, árduos tempos sejam de esperança por um futuro melhor, foi uma demonstração inequívoca de fé de que muitos olvidavam. Sua decisão, provavelmente, influenciará outros jogadores a seguirem o mesmo caminho – Jean e Wagner, por exemplo – e mostrará a todos que o Fluminense está vivíssimo, em que pese toda a negatividade, intra e extramuros, que vivenciamos desde o rompimento com a ex-patrocinadora.

O aceite de Fred, assim, teve, num primeiro momento, um valor preponderantemente simbólico. Simbolismo que representa no âmago de seus companheiros, dos dirigentes e da torcida um fator psicológico importante para que a equipe acredite no seu potencial e lute por títulos, dirigentes esmerem-se por honrar os acordos firmados e torcedores acreditem num ano melhor do que os dois últimos.

Mas Frederico também é goleador – não nos esqueçamos disto –, duas vezes artilheiro do campeonato brasileiro, edições 2012 e 2014, e sétimo maior artilheiro da história do Flu, com a possibilidade real de alcançar a vice-artilharia nos quatro anos que lhe restam de contrato. Ser o vice de Waldo, com 319 gols, não é para qualquer um; e, se fizer mais 43, atingirá o feito, ultrapassando Orlando Pingo de Ouro. Escreverá seu nome no pedestal dos maiores ídolos da gloriosa história Tricolor.

E se alguém ainda consegue questionar o seu custo-benefício, deveria saber que o nosso goleador, mesmo fora das quatro linhas, pode trazer ótimo retorno financeiro para o Fluminense. A confirmação da sua permanência, por exemplo, foi suficiente, por si só, para antecipar a renovação do patrocínio da Frescatto por mais um ano, garantindo mais quatro milhões de reais para os cofres tricolores – oito milhões por dois anos de contrato. E eu não duvido de que o seu nome vinculado ao clube por mais quatro anos seja fundamental para que fato semelhante também possa ocorrer em relação ao contrato firmado com a Viton 44 e, ainda, para atrair novos investidores.

Fred, portanto, também faz dinheiro e, bem explorado por um marketing eficiente, pode fazer muito mais.

Escrevi há alguns dias sobre idolatria e subjetivismo. Aceitemos ou não, Frederico é ídolo. Se não o seu, o de milhares ao seu redor. Minha filha, de oito anos, é sua fã. Para ela, falar em Fluminense é falar em Fred. Uma colega, flamenguista, já foi até as Laranjeiras e obeteve um autógrafo e uma selfie com seu ídolo. E assim é por todo o Brasil. Dom Fredon arrasta atrás de si uma legião de fãs, tricolores ou não.

Esse potencial, contudo, pode e deve ser melhor explorado. Fred vale não apenas pelo que é, mas pelo que pode vir a ser. O seu nome, associado a qualquer ação de marketing, qualquer produto, pode se traduzir em expressivo retorno para o Fluminense, seja financeiro, ou de exposição de sua marca, o que, invariavelmente, também se traduz, no fim das contas, em dinheiro. Quando se pretende impulsionar o projeto de associação ao clube, poder-se-ia pensar numa forma mais efetiva de se utilizar o garoto propaganda da empreitada. Ações presenciais e frequentes com o artilheiro, por exemplo, poderiam tornar-se um chamariz eficaz para atrair mais sócios.

Quanto vale Fred, então? Muito para os seus fãs, pouco para os seus detratores. Afora as opiniões extremas justificadas pela paixão, Frederico representou, representa e ainda representará muito para o Fluminense; seja por suas participações em dois títulos nacionais, seja pelas artilharias, pela liderança e dedicação dentro de campo; seja também pelo crédito de confiança que deu ao novo Fluminense, pela sua capacidade de atrair investimentos ou pela sua condição de ídolo de miríades de torcedores, fator crucial para um marketing agressivo e rico em contrapartidas para o clube.

Falta, entretanto, ao Fluminense, um marketing à sua altura.

Raro, se muito, um atleta profissional que ame o seu clube no futebol moderno. Mas se houvesse algo próximo do que se pudesse ter por esse nobre sentimento, talvez esta seja a relação que vivem Frederico e Fluminense, entremeada de guerra e paz, gáudios e tristezas, como nos casamentos mais duradouros. O “fico” do artilheiro estabeleceu um liame definitivo de cumplicidade e respeito recíprocos que a história se encarregará de contar aos futuros torcedores como uma das relações mais longevas e gloriosas do Fluminense.

Muito já critiquei Fred e muito ainda o criticarei, por certo, mas isso não me impede de reconhecer nele o seu valor como um dos mais importantes atletas que já envergaram a camisa tricolor.




domingo, 8 de fevereiro de 2015

Ufa!

Contra o Bangu e seu novo segundo uniforme – de gosto duvidoso, por sinal – o Flu fez um primeiro tempo um tanto econômico, por vezes confuso, mas eficiente. Wellington Silva parece querer apresentar-se como o melhor parceiro de Dom Fredon. O artilheiro marcou um belo gol e quase fez outros dois em lançamentos perfeitos do lateral. Aliás, para se livrar da forte marcação banguense, a saída foi o canto do campo, mais pela direita, com Lucas Gomes e Wellington, do que pela esquerda, com Giovanni e Marlone.

Na volta do intervalo, Cristóvão anunciou que trocaria Victor Oliveira e Lucas Gomes por Mattis e Robert. A sua intenção era melhorar a “triangulação” na frente. Particularmente, eu não vi necessidade e também não vi melhora da equipe. Ao invés disso, o time piorou, abdicou das jogadas pela direita e passou a ter menos jogadas ofensivas. O Bangu, é claro, gostou. E passou a controlar o meio e a levar perigo à nossa defesa. Primeiro, um gol aparentemente mal anulado. Depois, numa falta muito bem batida, fez o gol de empate.

Mesmo com o Flu jogando mal, Fred parou algumas vezes no bom goleiro banguense e Marlone, mais uma vez, perdeu gol incrível.

 sombra de um empate indesejado, o Tricolor partiu para cima e, Robert, que até então pouco aparecera, resolveu dar sinal de vida pela esquerda. Por lá, mesmo sem a triangulação imaginada pelo treinador, recebeu passe milimétrico de Jean e fez um golaço, digno de gente grande.

Quando Cristóvão fez duas substituições no intervalo, principalmente quando trocou um zagueiro por outro – sem aparente necessidade – arriscou perder opções para mudar o panorama da partida. Teve que encontrá-la dentro de campo, na medida em que deslocou o jovem de Xerém para a esquerda e, por lá, a equipe encontrou o gol. Foi salvo pela habilidade do garoto, porque se o gol não sai seria, com justiça, muito criticado pelas substituições que fez e responsável direto pela perda de pontos importantes.


Se o Flu, assim, ainda não foi o que dele se espera, demonstrou, como já vinha demonstrando, ser uma equipe que está em busca do melhor entrosamento, mesclando jovens e veteranos, o que lhe dá uma característica peculiar, bem diferente da que vimos nos dois últimos anos: o time passa a ser experiente e ágil. E a mais clara consequência disto é a facilidade com que o artilheiro Fred tem encontrado oportunidades para marcar.

sábado, 7 de fevereiro de 2015

Unidos ou reunidos?

Segundo a coluna Panorama Esportiva deste sábado no jornal O Globo, Fluminense e Flamengo se reuniram durante a semana a fim de organizar um luta política conjunta por reformas na Federação de Futebol do Rio.

Pretendem mudar o modelo de gestão na entidade, criar uma liga municipal, dar transparência às taxas cobradas nos borderôs, dentre outras ações. 

Nunca vi, desde que Flu e Fla se levantaram contra os abusos perpetrados pela Federação através de notas oficiais assinadas conjuntamente e tarjas de luto nos uniformes de jogo, nenhuma relação que denote intimidade a ponto de ensejar preocupação de parte da torcida tricolor. 

Parece claro que as duas instituições apenas defendem interesses comuns, e justos, contra arbitrariedades praticadas por um dirigente vetusto que comanda a sua entidade sem transparência e à revelia dos bons rumos do futebol. 

Do lado de cá da trincheira, tricolores e rubro-negros tentam modificar uma cultura de quase trinta anos de desmandos, sem que, para tanto, isso signifique que o Tricolor ponha de lado as divergências históricas que o separam de seu rival. Por isso, pode-se dizer que, nessa louvável luta, Fluminense e Flamengo estão mais reunidos do que unidos.

@FFleury 

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Uma boa impressão

É sempre temerário traçar um panorama do que pode render uma equipe a partir de uma única partida, sobretudo quando esta é a primeira de um torneio que não pode servir de parâmetro para o restante da temporada. Afora os grandes clubes, e neles incluo o Botafogo em respeito ao seu passado, nenhum dos demais representa um grande desafio para as equipes de maior investimento.

De toda a sorte, sempre é muito bom começar o ano oficial com vitória. Foi magra, mas foi importante, porque tirou dos novatos que estrearam hoje o peso da primeira vez diante da torcida com o manto tricolor. E ela foi construída no primeiro tempo, quando o time foi melhor, em que pese um ou outro erro de posicionamento da defesa.

Dos quatro (depois cinco, com a entrada de Marlone) novatos tricolores, gostei mais do Lucas Gomes, que saiu no intervalo de jogo. Apesar do nervosismo da estreia, contudo, nenhum deles me decepciono. O já citado Lucas foi muito bem pela direita em parceria com Renato. Vinícius fez um belo gol, demonstrando frieza e categoria. Victor Oliveira não comprometeu na zaga e, me pareceu mais seguro que Mattis e Giovani, apesar de mais discreto – percebeu-se durante a transmissão a preocupação de Cristóvão com os seus avanços – também fez algumas boas jogadas. Por último, Marlone mostrou que tem boa técnica, mas, ansioso, desperdiçou algumas oportunidades.

Imagino que, com o tempo, os jogadores que se foram não deixarão saudades. Se não temos tanta qualidade como antes, o time sobressai-se em disposição.

O Flu venceu bem, oscilou alguma coisa na defesa, o que se justifica pela falta de entrosamento e deu espaços ao adversário a partir do primeiro quarto do segundo tempo. A saída de Vinícius, trocado por Walter, talvez explique essa foruxidão no meio. Alguns sustos, mas, no todo, o Tricolor controlou bem o jogo, marcou com consciência e foi disciplinado na maior parte do jogo.

Como eu disse, nenhum panorama pode se traçar tão precocemente, mas a minha primeira impressão foi bem melhor do aquela que o time me passou nos dois jogos da Florida Cup. E foi bem melhor do que eu imaginava para o Flu depois de perder quase meio time.


Se perdemos o rótulo da qualidade técnica, penso que ganhamos outro, o de uma equipe preponderantemente raçuda. Rejuvenescido dentro de campo, esse “novo” Fluminense, mais ágil, pode dar um bom caldo.

Avante, Fluminense! ST!