domingo, 19 de fevereiro de 2017

Sobre a torcida única nos estádios

A pedido do Ministério Público, o juiz Guilherme Schilling decidiu, em caráter liminar, é bom que se diga, que os clássicos regionais daqui por diante só poderão ter uma torcida. A manifestação do MP estadual foi motivada pelos graves confrontos ocorridos no último clássico entre Flamengo e Botafogo, cujo saldo foi de oito pessoas baleadas, sendo uma morta e duas gravemente feridas. Na verdade, a violência desmedida entre torcidas organizadas naquela partida foi apenas a gota d`água para a adoção de uma medida que já vinha de desenhando há tempos e, inclusive, já fora adotada em São Paulo e Minas.

Trata-se, todavia, de uma medida simplista, uma resposta pronta à sociedade e à mídia que clamavam por um basta nessa onda de violência que assola os estádios e seus arredores em dias de grandes jogos. O Poder Judiciário, chamado a intervir, não pode se omitir e foi por isso que o juiz decidiu.

A proibição de jogos com duas torcidas em clássicos retira a responsabilidade estatal e a transfere ao torcedor, uma vez que é dever do Estado zelar pela segurança do público que vai a uma partida de futebol. A questão, assim, é de segurança pública e se afasta do âmbito desportivo. Torcedores organizados que praticam crimes são menos torcedores que criminosos e devem ser tratados como tais, inclusive sendo alvo das políticas de segurança do Estado e dos órgãos de persecução penal.

A Justiça, com essa decisão de cunho proibitivo, na verdade retirou um grande peso das costas de um Estado que é ineficiente naquilo que é sua obrigação primeira: garantir a segurança e a liberdade de ir e vir de seus cidadãos. E, consequentemente, ajudou a por mais pá de terra num futebol moribundo, cujos romantismo e glamour se esvaem à medida que o Maracanã também se deteriora.

Qualquer estudioso de segurança pública e, mais especificamente da infiltração das organizações criminosas relacionadas ao tráfico de drogas nas torcidas organizadas, poderá dizer com mais propriedade que a solução para a violência entre as torcidas não passa nem de perto pelo que decidiu o nobre magistrado. A prova cabal e mais recente disso foi a brutal tentativa de homicídio que vitimou o torcedor tricolor Pedro Scudieri, que voltava para sua casa após um jogo do Fluminense contra a Portuguesa. Ou alguém pode imaginar que os agressores tenham sido torcedores do clube da Ilha do Governador?

Torcidas organizadas, não é de hoje, marcam seus confrontos pela internet. Na falta de um serviço de inteligência eficaz, porém, adota-se a resposta óbvia e inócua que, a bem da verdade, nada resolverá e apenas desincumbirá o Estado de sua função que é garantir a segurança de sua população.

Se quisessem realmente resolver o problema, ou pelo menos minimizá-lo, deveriam seguir nossas autoridades o exemplo inglês. Lá, o gravíssimo problema dos hooligans foi praticamente solucionado quando todos os times ingleses foram obrigados a instalar em seus estádios sistemas de monitoramento por câmeras, a fim de que a polícia pudesse realizar um pente fino à procura de torcedores brigões. Localizado o torcedor indesejado, é imediatamente retirado do estádio. Além disso, há sempre um policial escalado para estudar o comportamento dos torcedores de cada clube profissional inglês, cujo relatório de informação ajuda na identificação dos torcedores mais perigosos.

Brasil não é Inglaterra, mas parece óbvio que um trabalho de inteligência policial bem desenvolvido pode ajudar a antecipar as ações desses criminosos, possibilitar suas prisões e evitar mortes. Não obstante, o Ministério Público e o Judiciário devem tratar os crimes praticados por esses vândalos com a gravidade que merecem, responsabilizando hordas de torcedores brigões como verdadeiras associações criminosas, o que afastaria, nesses casos, a competência dos Juizados Especiais Criminais que cuida apenas de delitos de menor potencial ofensivo e que nem mesmo ensejam a prisão.


Mas, ao invés de agir para resolver o problema, preferiu-se a saída mais fácil e menos onerosa para o Estado: a torcida única. Com essa decisão mata-se o futebol, mas não se mata o problema.

domingo, 12 de fevereiro de 2017

Abel Braga

Abel Braga já vinha reclamando do calendário de jogos neste início de temporada. Sem dizer claramente, podia-se ler nas entrelinhas que a sua irresignação era com a Primeira Liga. Abelão prefere o campeonato carioca. Decisão dele, da qual particularmente discordo, mas respeito.

Todo treinador tem suas manias e teimosias e Abel não foge à regra. Poderia ter poupado o time no campeonato carioca, competição em que o Flu já está classificado para a próxima fase. Não o fez de propósito, porque queria mostrar que o que lhe incomoda é a Primeira Liga.

Não discuto o mérito da sua decisão. Ele é o treinador e é regiamente pago para planejar e executar o que for melhor para o time. Assume os ônus e os bônus de suas decisões e deve ser cobrado ou celebrado por isso.

A derrota para o Internacional não foi boa para o Flu. Nunca é, mas penso que pelo menos uma constatação deve ter tido Abelão: o Fluminense não possui um elenco para disputar as principais competições nacionais. Tanto é que o planejamento Tricolor  que previa grupo fechado para o primeiro semestre, já está sendo reformulado. Pelo menos um novo reforço deve chegar ao Flu em breve.

Apesar de seu jeito simples e espontâneo, às vezes espontâneo e sincero demais, Abelão é um treinador que fala a linguagem do jogador, agregador e, sobretudo, um vencedor. Chegou ao Flu e apenas na conversa e com três reforços, mudou da água para o vinho uma equipe em que ninguém mais confiava.

É isso o que torcedor tricolor espera: uma equipe competitiva, aguerrida, vencedora. Talvez por isso as primeiras críticas após a derrota para o Internacional. Não pela derrota propriamente dita, mas pelas más lembranças de 2016. Quando o tricolor já vinha se acostumando a uma nova rotina de vitórias, o malogro foi uma ducha de água fria, principalmente porque o time colorado é muito fraco, dando a sensação, a quem assistiu à partida, de que o nosso time titular poderia vencê-los até com certa facilidade.

Além da quebra da boa sequência de vitórias, perder para o Inter talvez não traga consequências maiores. O Flu deverá se classificar na Primeira Liga, isto é, se Abelão entender que deve jogar de agora em diante com força máxima. Todos já entendemos que ele não aprova a competição que o Flu ajudou a criar, mas já chega. Ou a disputa seriamente ou não disputa mais.

Abelão, a meu ver errou pela primeira vez nessa nova passagem pelo Flu. Errará outras, mas para se avaliar o seu trabalho será preciso sopesar seus erros e acertos, ponderá-los e ao fim constatar o que prepondera.

De qualquer forma, Abel Braga não é homem de fugir das divididas. Se realmente continuar a preterir a Primeira Liga, deverá arcar com as consequências, especialmente se o Flu não conquistar o carioca, competição em que aposta as suas fichas.


Abel é o melhor que podemos ter no momento, é o responsável pela nova “cara” do Flu nesse início de temporada e merece toda a confiança da torcida tricolor, o que não me impede, nem a nenhum tricolor, de criticá-lo quando errar. E aí está, diferentemente de muitos treinadores, uma outra virtude de Abel: a de assumir seus erros e aprender com eles.

domingo, 5 de fevereiro de 2017

Humildade e luta

Após o jogo contra o Resende, fiz uma pequena brincadeira: “Com mais dois Orejuelas e mais  dois Sornozas fechamos o grupo e ganhamos tudo este ano. Com seis equatorianos não vai ter para ninguém.” É claro que a metáfora conota a evidente qualidade técnica dos dois reforços tricolores, mas exageros à parte todos sabemos que, apesar do bom começo, teremos um ano difícil pela frente.

A dificuldade estará principalmente em manter o equilíbrio do time quando não se tem um elenco capaz de suportar o desgaste das longas competições que se apresentarão durante o ano, sobretudo o campeonato brasileiro. A alma que Abel Braga deu ao time é suficiente para vermos uma equipe brigadora o tempo inteiro, mas sem um elenco mais qualificado, lesões, convocações e outros intercorrências podem desfalcar o Flu de suas peças mais importantes.

Temos alguns jogadores da base que podem ajudar. E estão ajudando, mas para almejarmos com chances reais que conquista alguma competição, o Flu precisará estar sempre no limite e precisará de ajuda também de fora das quatro linhas.

É por isso que além da presença da torcida, cujo apoio será fundamental na temporada, vejo com grata satisfação o retorno de um dos mais capacitados profissionais da medicina ao Fluminense. Independentemente de posições políticas, o Presidente Abad agiu como se deve agir quem tem o Tricolor como prioridade, trouxe o Dr. Michael Simoni para a função de diretor do Departamento de Saúde. Mais um reforço de qualidade que muito contribuirá para que nossos profissionais, dentro de campo, tenham toda a tranquilidade para desempenhar suas funções.

Os melhores nomes tricolores têm que fazer parte da gestão e, ao que parece, o Presidente tem isso como princípio: vaidades de lado, o que importa é e sempre será o Fluminense.

Ponto para Abad. Outro golaço foi a contratação de uma auditoria qualificada para examinar as contas tricolores. Medida acertada e prudente, que dará à nova Administração a exata dimensão dos erros e acertos da gestão anterior e mostrará o que deve ser corrigido e trabalhado. Além disso, possibilitará a responsabilização de quem por dolo ou culpa agiu contra os interesses do clube ou lhe trouxe prejuízos. Começar o trabalho com a casa em ordem é tudo de que o Flu precisa para poder seguir em frente sem as amarras do passado.

Vida nova para o Fluminense. Começar com o pé direito nos gramados e fora dele é um bom sinal, sinal de que mesmo com um orçamento enxuto, mas com um grupo engajado e uma administração focada nos interesses do clube, algo de bom pode acontecer.


Se não conquistarmos um título, teremos lutado. E o Fluminense deve ser assim, um time guerreiro que luta até o fim por seus objetivos. O resto é consequência.